sábado, 24 de novembro de 2007

Dany silva - "Caminho Longi"

DANY SILVA PREPARA “CAMINHO LONGI”, NOVO CD
Foi para Portugal, mais propriamente para Santarém, fazer o curso de engenheiro técnico agrário e é nesta escola que o músico, cantor e compositor cabo-verdiano, Dany Silva, em parceria com alguns colegas, fundou a banda musical "Charruas". Nesta banda, Dany começou como baterista e depois passou para baixista, tendo ele nunca mais separado de uma viola baixo. É com o sucesso "Branco Velho, Tinto e Jeropiga" que se inicia a sua projecção para o grande mundo musical. Depois de sete anos sem gravar, hoje, Dany Silva prepara um novo trabalho, que será lançado em Fevereiro do próximo ano
Expresso das Ilhas - Dany Silva, a sua carreira musical, em Portugal, começou da melhor forma: como baixista e um dos cantores de "Charruas", a banda que mais marcou a batida «ié-ié», no final da década 60, nesse país. Como foi a experiência e quanto tempo durou? Dany Silva: "Charruas" foi a minha cartidjona no mundo da música. Entretanto, como era um grupo de escola, cada integrante do grupo foi terminando o curso e saindo. E foi desta forma que o grupo acabou. Esta banda gravou apenas um disco onde constam duas composições minhas. Como na escola o baixista estava no último ano do seu curso, então ficamos sem baixista. Foi assim que passei para a viola baixo, e desde esta altura, este instrumento acompanha-me até hoje. Só quando comecei a gravar, por uma questão de mais facilidade, em espectáculos, comecei a tocar viola. A viola baixo só tocava nos estúdios, em situações pontuais.
Expresso das Ilhas - Algumas canções originais que cantaram em inglês, chegaram aos tops musicais em Portugal. Que títulos foram da tua autoria?Dany Silva - Começamos a gravar com um disco chamado "Moleques Charruas", com uma editora que havia nesta altura, tinha depois temas meus, um era a música e outra a letra. A maioria das nossas composições era feita em conjunto. Era uma banda que imitava os Beatles. Este disco teve muito sucesso logo na altura do seu lançamento.
Expresso das Ilhas - No meio deste trabalho, onde ficou a música de Cabo Verde na sua vida?Dany Silva - Nunca deixei a música de Cabo Vede. Estava sempre em contacto com a música da nossa terra. Numa altura, surgiu uma oportunidade de gravar o primeiro disco, que foi com uma etiqueta que o Bana tinha que era o "Monte Cara". Mas é um single com apenas duas músicas, uma de cada lado, um LP (disco vinil), contendo uma Balada e um Blues. As músicas começaram a ser apresentadas na televisão portuguesa, foi quando uma editorada muito importante em Portugal, a Valentim de Carvalho, me convidou para gravar. Permaneci com esta editora durante quinze anos. O primeiro tema que gravei com eles, me tinham exigido que fosse em português, foi então aqui que surgiu o sucesso "Branco, Tinto e Jeropiga". Tive uma sorte enorme com esta música, porque é difícil alcançar o sucesso logo à primeira.Depois gravei outro max single como "Crioula de São Bento", cantado em português, num ritmo mais africano. Depois de estes dois sucessos, a nível de vendas, até que tive conversas com os responsáveis da Valentim de Carvalho, demonstrando-lhes a minha vontade de fazer uma coladeira cantada em crioulo, também uma morna. Então ficou combinado que iria fazer um LP com 10 temas onde, pelo menos, tinha que conter três temas em português. Quem produziu este trabalho, "Lua vagabunda", foi o Rui Veloso, onde também gravei outros sucessos como "Lua nha testemunha", "Um badjo na Fazenda", "Fidjo magoado", "Nha mudjer", na altura Paulino Vieira deu-me um tema, o "Sol de Manhã", entre outros. Mesmo cantando em crioulo "Lua nha testemunha" foi um sucesso não só entre os cabo-verdianos mas também entre os não cabo-verdianos.
Expresso das Ilhas - Esperava esta repercussão?Dany Silva - Não, porque quando uma pessoa faz um disco, normalmente não pensa num bom sucesso, mas pensamos, pelo menos, que tudo vai correr bem.
Expresso das Ilhas - A sua segunda experiência numa banda portuguesa foi no "Quinteto Académico+2", que teve também muito sucesso. Como foi a sua experiência nessa banda?Dany Silva - Em 1968, para 69, quando acabei o curso, havia, em Portugal, um grupo chamado "Quinteto Académico+2" que era formado por universitários, mas que já estavam numa fase profissionalizante, os empresários que tinham, e hoje um deles é director do Casino Estoril, dr. Mário Assis, resolveram transformar essa banda com uma projecção internacional. Nessa altura, estava em Lisboa a esperar a minha listagem para o serviço militar, dr. Mário Assis foi para a Inglaterra trazer um vocalista para a banda, que era um americano que estava nesse país, trouxe um organista e um trompetista. O baixista que estava com eles, por causa de problemas pessoais, foi substituído por mim. Por isso, a minha ida para a tropa foi adiada. E é nesta banda, o "Quinteto Académico+2" é que comecei a ter contacto com Blues e Soul Music. Saímos em várias digressões para a Europa e mais tarde para Moçambique, Angola e, claro, fazíamos digressões em Portugal. Em finais de 1969, este grupo veio a acabar, tendo feito a sua actuação no fim do ano lectivo desta altura. Em 70, fui para a tropa e, durante os três anos que lá permaneci, tocava esporadicamente. Quando regressei, entrei para a música como profissional.
Expresso das Ilhas - O seu grande sucesso musical, em Portugal, foi seguramente o tema "Branco, Velho, Tinto e Jeropiga". Conta-nos a história desta música e o que significou para a sua carreira?Dany Silva - Este tema é um dos obrigatórios, quando faço alguma actuação em Portugal. Muitas vezes, costumo deixá-la para o fim do espectáculo para cantá-la, mas o público, no meio da actuação, começa a pedir que eu cante "Branco, Tinto e Jeropiga".Esta música foi escrita numa altura em que eu era músico de Boite, isso quando tinha regressado da tropa. Como tocava à noite, terminava a actuação sempre tarde, passavam, muitas vezes, das três horas da madrugada. Muitas vezes, para relaxar, depois das actuações, íamos para um bar que chamávamos de "A taberna do João", o tal João era empregado desse lugar. Ali comíamos e bebíamos vinho. Numa dessas noites, estávamos na brincadeira com um violão e tentar satirizar com aqueles momentos. Passado dois dias o Engenheiro de som, Zunga Pinheiro, apareceu-me com a letra desta canção relatando essa noite. Tentei dar a esta música um rítmo tipo reggae. Já, quando Valentim de Carvalho contactou-me para gravar com eles, já tinha a música toda composta. Tive muita sorte com esta música, que foi um sucesso e abriu-me uma janela no mercado musical em Portugal e, depois deste trabalho, vieram muitos outros. Na vida dos músicos, às vezes, só talento para ter sucesso não basta. É preciso termos um bocadinho de sorte. Eu tive esta sorte. É uma música marcante para mim. A primeira música que espalhou o meu nome e o meu curso de regente agrícola ficou na gaveta, até hoje.
Expresso das Ilhas - Considera-se um músico luso-cabo-verdiano ou simplesmente cabo-verdiano?Dany Silva - Musicalmente é difícil dizer, mas penso que se, ao invés de dizer luso-cabo-verdiano, dizer cabo-verdiano-luso era o mais provável, porque a parte cabo-verdiana está sempre em primeiro lugar. Mas, dado à minha vivência em Portugal, tenho influências de ritmos desse país: fado, música popular portuguesa. E esta mistura de influências de Cabo Verde e de Portugal estão dentro de mim. E é por isso que não digo que sou um típico músico cabo-verdiano, como é o Bana, a Cesária Évora e, como foi Ildo Lobo. Eu tenho outros estilos, outras influências de música que eu trouxe para perto da música cabo-verdiana. E penso que consegui fazer isso, não querendo ser juiz do meu trabalho, mas acredito que é notável no que tenho feito.
Expresso das Ilhas - Já participou em muitos festivais e concertos em Portugal e não só. Quais os mais memoráveis?Dany Silva - A minha participação na segunda ou terceira edição do Festival da Baia das Gatas é a mais memorável. Tinha vindo com a minha banda e ficamos hospedados numa escola, porque a organização do evento não tinha condições para nos colocar num hotel. Nessa altura, mês de Agosto, os alunos estavam de férias. Nessa escola, estavam também hospedados os outros músicos que vieram de Portugal, como Paulino Vieira, o grupo de Voz de Cabo Verde, que acompanhava Bana nas suas actuações. Também estavam nessa escola músicos de outras ilhas e o único convidado internacional, um músico cubano, que tinha vindo cantar em play back porque a banda não poderia vir com ele, por falta de recursos da organização do festival.Para além desse aspecto, o espectáculo, em si, foi uma maravilha, como o festival estava no princípio, aquilo era uma novidade, havia um ambiente extraordinário. Mesmo com fracos recursos e fraca condição de material, por exemplo, a aparelhagem era de baixa potência, essa edição do festival foi um sucesso.Não me esqueço de nenhum detalhe deste festival. Lembro como se fosse hoje.
Expresso das Ilhas - Qual dos seus vários trabalhos discográficos considera o mais conseguido?Dany Silva - É difícil dizer, porque cada um, a seu tempo, foi bem conseguido e todos muito importante. Hoje, se os for ouvir para fazer esta avaliação, depois de passado tanto tempo, tantas coisas já mudaram, a minha concepção em relação à música já mudou, não seria justo considerar, por exemplo, o primeiro trabalho menos conseguido ou o terceiro trabalho mais conseguido.
Expresso das Ilhas - Tem contrato com alguma editora portuguesa?Dany Silva -Neste momento, não tenho contrato com nenhuma gravadora.
Novo disco depois de sete anos sem gravar
Expresso das Ilhas - Está a preparar um novo disco que vai ser lançado em Fevereiro do próximo ano. O que nos pode dizer deste trabalho?Dany Silva - O nome deste álbum é "Caminho Longe", que fiz em homenagem ao meu irmão que faleceu em 2001, mas também em homenagem a todas as pessoas que vamos perdendo pelo caminho, na vida. Há três anos que tenho esta maqueta gravada. Mas tentei negociar com algumas editoras em Portugal, mas a situação das editoras está muito difícil por causa da pirataria. As editoras estão a perder dinheiro, não conseguem investir.Este novo trabalho tornou possível graças a um convite que recebi de um produtor americano, o Berry, para gravar nos Estados Unidos da América. Uma parte deste disco foi feita nos EUA, onde participaram alguns músicos cabo-verdianos residentes nesse país, Djim Djob, Ramiro Mendes, Kalú Monteiro, entre outros. A outra parte deste trabalho foi feita em Lisboa, no estúdio do Rui Veloso, adicionar a este trabalho instrumentos típicos de Cabo Verde, como cavaquinho, violão, etc.No CD, constam 12 faixas musicais, onde apenas duas músicas não são inéditas. Gravei uma nova versão da música "Mamãe África", onde faço um dueto com um cantor americano e ele canta uma parte em inglês, a outra música é "Foi por ela", do músico português Faustino. Tornei esta música popular portuguesa numa morna. Mais informações deste disco, terão oportunidade de conferir no próximo ano.
Expresso das Ilhas - Qual a sua opinião sobre as novas tendências da música cabo-verdiana?Dany Silva - O trabalho que alguns músicos contemporâneos, como o Tcheka, Vadú, é espectacular. Eles estão a fazer um trabalho que, para mim, é inovação. Eles introduziram aos ritmos do interior de Santiago novos instrumentos, como a viola. Esses ritmos, conheci-os apenas com voz e percussão.
Expresso das Ilhas - O Governo não podia fazer mais pela música...?Dany Silva - Falando da realidade que conheço, em Portugal, a pirataria está terrível. Sei que há uma tentativa em acabar com este mercado negro, mas tem-se feito apreensões de reproduções de álbuns, mas no outro dia parecem novos no mercado. Acredito que quanto mais incrementado for a luta contra isso, melhor será o resultado. Se o infractor começar a ser punido com penas mais pesadas, talvez venha a dissuadir um bocado.
Expresso das Ilhas - Pensas ter alcançado já tudo na música?Dany Silva - Não, porque, a todo dia, estou aprendendo coisas novas e assim vou inovando o que sei. A minha vida é música, se disser que já alcancei tudo o que queria nesta área, então quer dizer que teria de parar por aqui.
Expresso das Ilhas